terça-feira, 21 de maio de 2013

Constituição e família (Sobre questionamento ao Casamento Gay)

Resposta ao e-mail enviado aos Senadores que representam o Estado do Rio de Janeiro

Meu e-mail:

Excelentíssimo Senhor Senador da República,

O direito que os casais homossexuais adquiriram de se casar, assim como o de formar família, inclusive com a adoção de crianças, por acaso não vai contra a Constituição Federal? Não seria inconstitucional?


Constituição da República

CAPÍTULO VII - DA FAMÍLIA, DA CRIANÇA, DO ADOLESCENTE E DO IDOSO
Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.
§ 1º. O casamento é civil e gratuita a celebração.
§ 2º. O casamento religioso tem efeito civil, nos termos da lei.
§ 3º. Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a
mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.
§ 4º. Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos
pais e seus descendentes.
§ 5º. Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo
homem e pela mulher.

 

Atenciosamente,

 
Leandro Maia Gonçalves


Resposta do Senador Eduardo Lopes (PRB-RJ):


Prezado Senhor Leandro Maia,

 

Incumbiu-me S.Exa. o Senador EDUARDO LOPES, de lhe encaminhar as considerações seguintes, sobre as suas indagações.

Att,

Ailton Cardoso da Silva

Assessor Técnico

Gabinete do Senador EDUARDO LOPES

Representante do Estado do Rio de Janeiro

Anexo II, ala Ruy Carneiro, gabinete 2, 70165-900

(61) 3303-5730/5225 fax 3303-2211
Visite: http://www.senado.gov.br/senadores/dinamico/paginst/senador4767a.asp


“Caro Senhor Leandro Maia, 
 

Antes de tudo, agradeço-lhe a distinção de me consultar sobre tema de tamanha importância. Defendo que a participação popular direta no Poder Legislativo o legitima e enobrece. 
 

Senhor Leandro, como deve ser de seu conhecimento sou ministro de confissão religiosa. Embora licenciado desse ministério, em virtude da assunção do mandato no Senado Federal, é óbvio que mantenho convicções filosóficas coerentes com a fé que professo e, portanto, contrárias à prática do homossexualismo. Mas vou abdicar de externá-las neste caso e interpretar essa realidade social segundo a ótica da legalidade, pois é sobre esse aspecto que V.Sa. me indaga. 
 

A formação de entidades familiares entre pares do mesmo sexo sempre foi contestada, até que, acolhendo provocação do Governador do Estado do Rio de Janeiro, através da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº. 4277, o Supremo Tribunal Federal (STF) manifestou-se, mediante “interpretação conforme a Constituição”, sobre o art. 1.723 do Código Civil, assim redigido: “É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família.”. 
 

Feito isso, o STF decidiu, por unanimidade, dar ao referido dispositivo legal interpretação excluindo qualquer significado que impeça o reconhecimento da união contínua, pública e duradoura entre pessoas do mesmo sexo como “entidade familiar”, entendida esta como sinônimo perfeito de “família”. Ou seja, segundo aquela Corte, o reconhecimento da união estável estabelecida entre pares do mesmo sexo deverá ser feito segundo as mesmas regras e com as mesmas consequências da união estável heteroafetiva. 
 

Com o devido respeito que merecem os integrantes da mais alta Corte do Poder Judiciário, estou convencido de que eles incorreram em grande equívoco nessa decisão. 
 

O art. 1.723 do Código Civil nada mais faz que reiterar o que afirma o art. 226 da Constituição Federal, confira: 
 

Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.

§ 1º - O casamento é civil e gratuita a celebração.

§ 2º - O casamento religioso tem efeito civil, nos termos da lei.

§ 3º - Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.

§ 4º - Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes.

§ 5º - Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher.

§ 6º O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio. (EC nº 66, de 2010)

§ 7º - Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento FAMILIAR é livre decisão do CASAL, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas.

§ 8º - O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações. 
 

Ou seja, para a Constituição a união heterossexual, estabelecida entre homem e mulher, é a que define a configuração do vínculo familiar capaz de constituir união estável passível de ser convertida em casamento, observadas as exigências do art. 1.723 do Código Civil: convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família. 
 

A leitura que faço da garantia constitucional de que “o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito (art. 226, § 7º), me convence de que a procriação insere-se como resultado esperado da formação do vínculo familiar, o que geneticamente só é possível mediante a conjunção carnal entre pessoas de sexos distintos.
 

Embora eu discorde na essência sobre a união entre pessoas do mesmo sexo, defendo que elas devem ter garantidos direitos decorrentes, por exemplo, da formação de patrimônio comum. Mas nada até hoje me convenceu de que esse tipo de união esteja contemplado pela Constituição como aquela estável e passível de conversão em casamento. Acredito que esse tipo de união pode, quando muito, configurar uma espécie de “união civil”, não cabendo solucionar as relações jurídicas dela decorrentes à luz do Direito de Família. 
 

Já sobre a questionada possibilidade de adoção de crianças por pares homossexuais faço algumas considerações. A primeira é que isso pode representar indesejável comprometimento ao desenvolvimento psicológico da criança. Ser apresentada em seu contexto social na companhia de duas mães ou dois pais, por exemplo, é algo que foge à tradição natural e, portanto, negar as implicações decorrentes é ingenuidade. Lamentavelmente, a interpretação feita pelo STF acabou por comprometer a liberdade dos juízes de aferir a possibilidade de tais implicações, quando da análise de casos concretos.
 

Dito isso, lembro que Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) possibilita à pessoa homossexual adotar, já que para isso independe o estado civil do adotante (ECA, art. 42). Mas, pela lei em vigor, se um par de homossexuais decidir por adotar uma criança entendo que seria necessário a um deles fazê-lo individualmente. Afirmo isso porque a lei exige para a adoção conjunta que sejam os adotantes casados civilmente ou vivam em união estável (ECA, art. 45, § 2º), hipóteses que, ao meu juízo, a Constituição Federal não contempla aos conviventes em união homoafetiva. Assim, concordo com V.Sa. de que a adoção por pares homossexuais contradiz a Constituição.
 

Senhor Leandro Maia, este é um tema complexo. De certo que excelentes argumentos podem ser levantados contra as minhas convicções. Mas eu prefiro defendê-las com sinceridade a acompanhar as vozes daqueles que afirmam, até por conveniência, a união estável e o casamento entre pessoas do mesmo sexo como possibilidades contempladas na Constituição Federal. Embora afirme em contrário o STF, a Constituição Federal é, para mim, de uma clareza solar. 
 

Na esperança de tê-lo atendido, reitero o meu agradecimento por sua deferência de me consultar sobre tema tão importante. 
 

Att,
 

EDUARDO LOPES



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Qual a sua opinião sobre esse tema?

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